O Jardineiro do Ano
Não foi alguém que frequentou colunas sociais e baladas ou circulou nos bares da moda. Ele não pertence a tribo alguma.
Devotado, destinou cada dia, cada momento a cuidar dos muitos jardins que lhe eram confiados. Semeou um pouco de tudo e plantou aspirações, cultivando perfeitamente com suas muito usadas ferramentas. Não ficava totalmente satisfeito com o rumo que a natureza imprimia ao seu trabalho, apesar disso ,entendia que sua diretividade terminava onde as vontades de toda essa força ativa, que comandava a ordem natural de seus jardins, deveriam prevalecer sobre seus próprios desejos e até caprichos. Tomava cuidado ao podar algo, imaginando que isto poderia interferir no livre arbítrio da planta e tentava corrigir sua postura, conduzindo delicadamente seus ramos, disciplinando o crescimento. Afinal de contas, não tinha sentido impor uma ordem rigorosa e sim liberar esse potencial de crescimento, respeitando a energia e o histórico que ela possuía, levando em conta a capacidade de gerar folhas, flores e frutos. Ele entendia que seu trabalho era o de facilitador, de alguém que estimula, e não do jardineiro que arbitrariamente impõe uma paisagem submissa e obediente, dificultando sua naturalidade.
Os dias bons eram de sol e os chuvosos, benignos. As garoas traziam gotinhas miúdas que pareciam flutuar no ar e acariciavam as árvores, e os torós davam shows com trovoadas, relâmpagos e raios, para tempestuosamente animar a turma verde, como em um Woodstock tropical. Depois a luz do sol se assomava, marcando cada matiz, cada cor e, associada com as copas das árvores, rendava os gramados úmidos e brilhantes.
Às vezes ele pensava se sua presença era indispensável, se tudo isso não aconteceria espontaneamente mesmo sem seu trabalho cotidiano. Ai lembrava-se das formigas, das lesmas, da tiririca e compreendia que era seu dever proteger o que era bom daqueles prejuízos que traziam tortura e infelicidade para seus jardins. Essas pragas não significavam exatamente o mal, mas flagelos a serem evitados, obstáculos para o que era valorizado como bom. Cabia a ele, enfim, a escolha que determinava o que era nobre do que era imperfeito ou danoso. Ele, um simples jardineiro, devia escolher o que predominaria nesses pequenos campos cultivados.
Seu nome pouco importa, não consta na lista das personalidades de 2013, como Edward Snowden, o Papa Francisco ou Joaquim Barbosa.
É provável que se chame apenas Zé.
Raul Cânovas nasceu em 1945. Argentino, paisagista, escritor, professor e palestrante. Com 50 anos de experiência no mercado de paisagismo, Cânovas é um profissional experiente e competente na arte de impactar, tocar, cativar e despertar sentimentos nos mais diversos públicos.
adorei, Raul! aproveito pra publicar esse artigo também
tuas inspirações são maravilhosas
que em 2014 continues a nos presentear com elas
Ana, te envio meu abraço paulistano a esse coração do Rio Grande do Sul que é Santa Maria,
cidade que guardo junto com outros tesouros, dentro da minha alma.
Estaremos juntos neste ano que acabou de nascer!
Muito boa descrição e que neste ano de 2014 possamos continuar a contribuir para uma paisagem melhor FELIZ 2014 a todos.
Faço também meus seus desejos Hamilton.
Até – sonhar não custa nada – pensar em um mundo melhor que troque fuzis por enxadas e degradação por árvores floridas.
FELIZ 2014!
Maravilhosa descrição, poderia se chamar Joaquim, meu avô, um encanto este texto, parabéns !!!
Obrigado Rose, pelo elogio e por apresentar-me o senhor Joaquim, seu avô.
Um bom 2014!