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Paisagismo e Jardinagem

Paisagismo e originalidade

Pergunto: até que ponto nós os paisagistas, somos obrigados a sermos criativos? Por que em cada projeto precisamos desenhar um jardim único e incomum?

Criatividade

Bem, seguramente porque escolhemos uma atividade que nos obriga a produzir a partir de um vazio. Temos que dar existência a algo que antes não aconteceu; onde não era nada. Esse vazio esse espaço tem, por assim dizer, uma vocação, assim como, uma tendência natural para receber uma determinada vegetação, seja pelo tipo de solo ou pelo clima onde está localizado. O terreno baldio que receberá esse jardim deverá ter uma personalidade que a diferencie das demais; será uma construção viva que irá representar a história e o folclore do lugar geográfico, onde está localizado; não seria coerente reproduzir uma paisagem francesa no sertão pernambucano ou, um jardim Zen budista em um barzinho da pauliceia. No primeiro exemplo, porque estaríamos negando a rica floresta de Bonito, com suas cachoeiras deslumbrantes; o Vale do Catimbau e su a flora característica e as praias de Porto de Galinhas que serviriam de inspiração, sempre que pensemos em algo impar e genuinamente pernambucano. Se vamos projetar uma área verde em nesse estado, porque não buscar inspiração nesses locais citados? Por que pressupor que aquilo que vem de fora é mais chique? Para imitar o estilo francês precisaríamos ser como eles, sentir como eles. Os jardins de Versalhes, de Vaux-le-Vicomte e do Château de Chenonceaux são o resultado de uma época onde o barroquismo impunha traçados cheios de artifícios e plantas excessivamente podadas, para demonstrar o poder do reino sobre tudo e sobre todos, inclusive sobre a natureza. Será que, desde o ponto de vista socioeconômico, isto tem a ver com a gente?

Autoestima

No segundo exemplo nos deparamos com algo deplorável que, infelizmente, é bastante comum, e é essa coisa de reproduzir um jardim pleno de misticismo, em um local aonde as pessoas vão para se divertir; ninguém frequenta um barzinho para meditar, pessoa alguma vai alcançar o satori, que é o estado de iluminação profundo e verdadeiro do budismo, com um copo de cerveja na destra. Paisagismo também é cultura, e o respeito é uma prática social inerente a ela. Imaginou entrar num botequim em Tóquio e encontrar símbolos cristãos fazendo parte da decoração? Pois é, não dá para supor um mau gosto desses.

Voltemos ao tema. É impossível dissociar criação de originalidade e esta originalidade não significa fazer sempre jardins singulares, mas sim, sermos singulares utilizando a matéria prima essencial: a planta. Um projeto paisagístico impar é notável quando expressa exatamente o pensamento do criador, que representou o aparecimento de algo único, considerando o pendor desse espaço, sua situação e as circunstâncias que permitiram delinear uma paisagem de produção pessoal.

O paisagista brasileiro precisa declarar sua independência. Assim como em 1822 nos emancipamos do colonialismo português, hoje é necessário libertarmos das ideias que nos chegam de fora; devemos vasculhar fontes de informação observando: nossa flora, nossos hábitos, nosso folclore pleno de personagens, valorizando nosso Curupira e deixando de lado celebrações que não tem nada a ver com a gente, como é o caso do halloween.

É uma questão de autoestima. Como não sentir estima pela flora mais rica do planeta? Como não sentir estima pela arte de nosso país?

Experimente o gostinho de nossa paisagem.

Responder Raul Cânovas Cancelar resposta

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22 Comments

  1. É o meu primeiro mês como paisagista!
    Que bom que te encontrei! Vou ler tudo aqui!
    Amei como expõe as ideias, fez meu coração vibrar!

    Deus abençoe!

    • Ah, Emille,

      Que linda mensagem! Espero que seja nossa seguidora!!!

      Abraços

  2. EXCELENTE Gracias gracias gracias

    • Soy yo quien agradece, Susana!

      Abrazos

  3. Bela exposição Raul!!!

    • Agradeço sinceramente seu elogio, Silvio!

      Grande abraço

  4. Maravilhoso como sempre e por coincidência esse foi o tema do meu café da manhã com.meu marido falávamos em valorizar mais o que está aqui dentro do nosso Brasil e deixar, principalmente de americanizar e de consumir esse país do Norte, como series, filmes, etc. No paisagismo acho sublime pensarmos que é uma questão ambiental mesmo, usar nossa vegetação, pouco conhecida, em nosso meio. Valorizar as nossas plantas é resgatar o nosso meio ambiente. Precisamos de urgência nisso, pois ja temos biomas com risco de sumirem e isso é muito triste.

    • Bom dia querida amiga,

      Gostei muito do seu comentário. Realmente precisamos considerar melhor nossa identidade, ela é a essência do que é real na nossa vida.

      Abraços

  5. Parabéns sempre!!!
    Sou sua fã de carteirinha…
    Admiro seu conhecimento e a maneira que compartilha com todas as pessoas …da sua área ou leigos.
    Participei presencialmente de alguns cursos seus no Rio e em Sampa.
    Gratidão!!!
    Um gde abraço.
    Um grande abraço.

    • Obrigado Ângela! Seu seguimento é muito importante para mim, espero contar sempre com sua presença, mesmo por este canal!

      Abraços

  6. Comprei uma casinha centenária, colonial, de frente para a igreja – interior de Minas. Tem um grande quintal em aclive. Seu texto caiu como uma luva, traduziu meus pensamentos errantes. Sonho com um jardim desses antigos, sem muita regra, mas ao mesmo tempo que seja acolhedor e lindo, claro. Em busca de inspiração, não acho nada que realmente me encante entre os jardins brasileiros. Me deparo com os jardins estilo cottage inglês, que se aproximam do meu sonho. Seria possível esse encontro anglo/mineiro, com plantinhas bem brasileiras? Calambau tem clima quase mediterrâneo, rsrs, frio à noite e calor forte durante o dia.
    Bem, na realidade , queria agradecer o texto, abriu meus horizontes

    • Bom dia Heloísa,

      Minas tem uma historia intensa e muito característica. Creio que deve procurar plantas que se ajustem ao clima de sua cidade, preferentemente desse bioma. O estilo? Bem, sei que este é seu dilema, porém pode se inspirar nos jardins que Auguste François Marie Glaziou fazia quando Dom Pedro II era nosso imperador. O traçado era europeu e seguia a moda daquela época.

      Abraços

      • Obrigada pela atenção!

        • Você merece, Heloísa!

  7. Lindo amigo

    • Obrigado Rosemar!

  8. Boa noite procurando plantas de flôr para sombra cheguei aqui, fiquei encantada com o que li, e agoniada.Não sou proficional,o meu jardim?estou transformando o meu quintal num jardim usando a intuição, o que leio,eu adoraria ver você andar no meu jardim onde as plantas nativas se misturam as cultivadas,caraibas,ipês roxo jatobá anjico pau ferrosão joão,agaves bromélias aroeira pimenteira garajau bom tem mais o que me doeu foi o entendimento que a araucaria bem ali quase na frente da casa não deveria está não faz parte da nossa paisagem nordestina sertaneja. Náo tenho coragem de tirar tem uma história de natal envolvendo meu filho especial hoje com 34 anos. E ai?

    • Boa tarde Miraldina,

      Não corte essa araucária. Embora não seja do bioma nordestino, ela deve ser tratada como uma ilustre hóspede, vivendo em harmonia com todas as nativas que você cultiva.

      Abraços

  9. Sou admdado e do seu trabalho e do seu ponto de vista. Qdo faço um projeto, gosto de sentir o local. Se você respira o local, a natureza te pede, ela te guia, a vegetação vem na sua cabeça, parece que cada espécies te pede pra ir pra lá. Ela te fala que vai ficar feliz se você a coloca-la ali. Porisso que cada projeto é unico. Cada um tem a característica do paisagista criador. Adoro respirar a mãe natureza.

    • Oi André,

      Suas ponderações poderiam fazer parte do texto acima. Gostei demais!

      Abraços

  10. A sua clareza de expor pensamentos é maravilhosa…
    Concordo plenamente com tudo que vc narrou e sua brasilidade é incrível…
    Abraços

    • Oh, Ângela,

      Muito obrigado pelo comentário.

      Abraço grande

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