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Paisagismo e Jardinagem

O déficit da arborização urbana no Brasil

No final do mês de maio, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados sobre o mais recente Censo Demográfico, que fez a análise de características urbanísticas presentes no entorno dos domicílios brasileiros. Um desses indicadores referiu-se à presença, ou não, de árvores em frente ou próximas a cada uma das residências pesquisadas (Ver: Censo Demográfico 2010: características urbanísticas do entorno dos domicílios. Rio de Janeiro: IBGE, 2012).

Os resultados mostrados não foram nada animadores, haja vista que um em cada três domicílios brasileiros não possui uma árvore próxima de sua fachada, o que acumula um déficit mínimo de 15 milhões de árvores no país. São, portanto, 32% de residências não atendidas pelo benefício da arborização urbana, um total de quase 50 milhões de pessoas.

Outro indicador, também dramático, revelou que um terço das cidades brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes mantém entre 60% e 77,6% das suas respectivas populações sem o benefício da arborização urbana nas proximidades de sua residência. No total, apenas duas das cidades pesquisadas chegaram a apresentar índices mais satisfatórios: Goiânia (GO), com 89,5% e Campinas (SP), com 88,4%.

De acordo com o estudo do IBGE, as regiões mais arborizadas nos quarteirões, calçadas ou canteiros, concentram-se no Sudeste e no Sul do País, com 73,5% e 72,1% de cobertura, respectivamente. O Centro-Oeste, com 69,5%, e o Nordeste, com 61,5% ocupam posições intermediárias. Já as áreas menos cobertas pela arborização urbana localizam-se na região Norte, com apenas 36,7% na oferta do benefício. Aí, em plena área da Floresta Amazônica, surpreendentemente, as cidades de Manaus e Belém ostentaram índices baixíssimos de atendimento, de 22,4% e 25,1%, respectivamente.

Trata-se da constatação inequívoca dos malefícios da expansão desordenada e da metropolização crescente das capitais e grandes cidades brasileiras, irredutíveis em corroer a qualidade de vida urbana e dizimar tesouros arquitetônicos, como os dessas duas cidades amazônicas, consideradas verdadeiras joias da Belle Époque no Brasil. Belém, particularmente, se destaca no cenário histórico nacional por ter sido a primeira cidade a contar com a implantação dos conceitos de planejamento urbanístico, importados da França no século XIX, nos quais o paisagismo e a arborização das vias públicas ganhavam contornos estruturantes e fundamentais.

Os dados do IBGE revelaram, ainda, que a desigualdade social abrange também o acesso aos benefícios da arborização das cidades de todo o País. De fato, enquanto nas classes mais favorecidas o déficit de cobertura arbórea atinge 21,5% dos domicílios, para as de menor renda, este percentual dobra, elevando-se para 43,2%.

A redução das áreas verdes nas grandes cidades tem sido apontada como um relevante motivo para a queda da qualidade de vida e da saúde das populações urbanas. Entre os principais efeitos do excesso de edificações e da impermeabilização do solo estão: a limitação dos espaços disponíveis para o lazer e a prática de atividades físicas, o aumento das sensações de desconforto humano e a decisiva contribuição para a elevação das temperaturas médias das áreas urbanizadas, o que, entre outros aspectos negativos, favorece a proliferação de diferentes agentes patogênicos.

Além desses efeitos, podem ser citados ainda: a diminuição da capacidade de absorção das águas pluviais, o que facilita a incidência de inundações e alagamentos; a redução do resgate dos gases de efeito estufa, particularmente, o dióxido de carbono; e o aumento da inospitalidade à fauna urbana, exigindo-lhe maior esforço de resiliência (Ver: JUNQUEIRA e PEETZ, 2010. Imaginário da natureza na cidade: construções discursivas na publicidade imobiliária contemporânea – uma abordagem a partir do paisagismo e das áreas verdes urbanas. Anais do SILACC 2010 – Simpósio Ibero Americano “Cidade e Cultura: novas espacialidades e territorialidades urbanas”, São Carlos, 2010).

Neste contexto, os benefícios da presença de árvores saudáveis e abundantes nas áreas urbanas são conhecidos das administrações públicas e mereceriam maior atenção. Há que se notar que, em grande parte dos casos, o suprimento das espécies a serem cultivadas nas calçadas e canteiros públicos é originário da produção municipal, por meio, principalmente, dos viveiros e dos hortos florestais, administrados pelas próprias secretarias municipais do verde, do meio ambiente ou de agricultura e florestas, dependendo do modo como o setor apresenta-se localmente institucionalizado. Isso significa que os custos de plantio, desenvolvimento, manutenção e instalação das mudas arbóreas podem ser relativamente baixos e administráveis fora das estritas relações de mercado.

Porém, ao considerar que, certamente, nem toda a demanda poderia ser atendida pela oferta pública de mudas, o setor privado também se apresenta como grande beneficiário potencial dessa importante e inadiável melhoria ambiental. Estudos realizados pela Hórtica Consultoria e Treinamento, empresa paulista especializada em inteligência de mercado para a horticultura, apontam que o segmento de árvores, arbustos e palmeiras representa 26% do total do movimento financeiro de toda a cadeia produtiva de flores e plantas ornamentais no Brasil. Em 2011, isso significou vendas da ordem de R$ 1,14 bilhão.

Embora uma parcela relevante desse comércio seja feita fora do circuito dos mercados normatizados, um percentual não menos significativo ocorre nas dependências dos mercados de flores e plantas ornamentais, sob a administração pública ou autárquica (CEAGESP, CEASAs, Centrais de Comercialização e Abastecimento) ou cooperada. Se processos forem bem conduzidos no contexto de políticas públicas de interesse ambiental, focados no bem estar da população, tal fato poderá futuramente resultar em novas oportunidades comerciais e no desejável aquecimento do mercado da vegetação ornamental.

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11 Comments

  1. Em minha cidade,Mogi Mirim,não há políticas públicas de interesse ambiental, focados no bem estar da população.A população por sua vez não atenta para a importância de cuidar dos exemplares existentes e nem procura aumentar o seu número,aliás,infelizmente agindo de modo contrário,ou seja,danificando com podas drásticas as existentes ou,pior,eliminando-as,muitas vezes porque estão “sujando o jardim ou a calçada.Recentemente estive em uma rua e notei 98% de residencias sem árvores.Um morador plantou e cuida de uma Goiabeira,que produz fartamente e atrai muitos pássaros,também alimentados no chão com ração seca.Pouco metros abaixo uma moradora danifica a árvore defronte a sua casa “para que ela morra” e não suje a sua frente.Todos reclamando do calor e da prolongada estiagem.Penso que o melhor meio de amenizar o problema é a educação nas escolas.Poder público ausente e sociedade alienada.

  2. Interessante, Goiânia é uma das “melhores” em termos de arborização e mesmo assim sofre bastante com a impermeabilização, as outras devem estar em estados alarmantes. Na cidade em que nasci, na Bahia, há um número mais considerável de árvores próximo à residências, mas sempre em pontos isolados e é pobre em arbustos e outros gêneros do tipo.

  3. Por padrões da ONU, para ter uma boa qualidade de vida cada habitante deveria dispor de 12 m2 de área verde por habitante,o estudo do IBGE ,mapeou estes dados país afora?

    • Prezado Lailson,

      Obrigado por seu interesse!

      Na cidade de São Paulo, segundo um estudo da Hórtica Consultoria e Inteligência de Mercado, 72,88% da população vive abaixo do nível mínimo de área verde per capita recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de 12 metros quadrados.

      Porém, desconhecemos a existência de estudos semelhantes para outras cidades brasileiras.

      Um grande abraço. Um ótimo Natal e um 2014 repleto de alegrias e realizações, no qual possamo reverter esse triste quadro da arborização urbana no Brasil.

  4. Em Natal, o deficit arbóreo é grandioso e quem mais desmatou foi a gestão da Ex- prefeita caçada Micarla do Partido Verde! Hoje já temos uma elevação de mais de 3 graus na temperatura da capital Potiguar.
    Um abraço a todos e Feliz Natal!

    • Hórtica Consultoria Prezada Rose Dantas: nós, da Hórtica Consultoria tivemos a grande satisfação de trabalharmos em vários projetos no âmbito da Cadeia Produtiva de Flores e Plantas Ornamentais na Grande Natal (RN), os quais foram realizados sob demanda e em parceria com o SEBRAE /RN. O setor de paisagismo, arborização urbana e áreas verdes foi particularmente contemplado, e ainda com mais destaque, no Plano de Marketing para Flores e Plantas Ornamentais da Grande Natal (RN). Caso tenha interesse, esse material certamente está disponível no SEBRAE / RN. Ou então, entre em contato conosco, o que será muito bem vindo.

  5. Parabéns pela matéria. Também sou agrônoma e estou coordenadora do Parque Botânico do Ceará- CONPAM Conselho de Politicas de gestão do meio ambiente (Governo do Estado) e demos ontem inicio a um novo projeto em nosso estado VEIA VERDE,o marco zero foi no canteiro central uma grande avenida de nossa cidade, no trecho de 1,6 Km só existiam 40 arvores e plantamos mais 300, de 20 espécies nativas diferentes. O nosso maior entrave é a manutenção, nosso clima não nos permite plantar e esperar a chuva cair pois ela não cai, temos que fazê-la.
    Temos um viveiro de mudas nativas, jardineiros e muita VONTADE de mudar esse quadro tão cinza e esquecido por tantas gestões do nosso estado. QUEM QUER FAZ AGORA NÃO ESPERA ACONTECER…

    • Obrigado Taciana,
      em nome de Hélio Junqueira e Márcia Peetz.

      Esperamos que essas mudas que vocês plantaram, possam se beneficiar com as chuvas que devem começar agora em janeiro e que vão, pelo menos teoricamente, até finais de maio.

      Tomara que a iniciativa de plantar essências nativas prevaleça em cima das castanholeiras e dos fícus, dando espaço merecido para os joazeiros, as oiticicas e os angelins.

      Parabéns pelo trabalho!

      • Parabéns, Taciana Caracas, pelo belíssimo exemplo e entusiasmo!
        Vamos muito a Fortaleza e gostaríamos de conhecer o seu trabalho.

        Obrigado pelos comentários e contato.
        Desde já, desejamos um ótimo Natal e um grandioso 2014, repleto de alegrias e realizações.

        Endossamos as palavras do mestre Raul Cânovas, sempre atento e incentivador do uso e proteção das floras nativas regionais.

  6. Sou de Fortaleza e o que percebo das pessoas da cidade eh que elas nao se preocupam e derrubam as arvores com muita facilidade, principalmente, referindo-se a sujeira que elas fazem com a queda das folhas.
    Ultimamente houve uma poda na cidade contratada pela Coelce – Companhia de energia – que cortou praticamente as arvores pelo meio, alegando eles que os galhos nao podem bater nos fios. Mas como plantar se temos fios eletricos em cima das calcadas? Nao ha espaco, as calcadas sao estreitas. Tambem concordo com o incentivo a arborizacao urbana, acho que ela proporciona bem estar as pessoas. Eu mesma jah diversas mudas na cidade. Parabens pela sua materia.

  7. Parabéns, pelas publicações realizada, estamos juntos……

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